sexta-feira, 25 de junho de 2021

Rudyard Kipling

 

Os infelizes tempos modernos

Casa Comum, 31 de Março de 1936

Caro amigo

Será possível que estejamos condenados a viver num mundo de ditadores ? Parece que os velhos tempos, a velha ideologia, se agarra aos argumentos mais violentos para assegurar a sua continuidade. Por certo que os principais alvos a abater passam pelos mesmos de sempre a inteligência e a cultura, os seus interpretes mais notáveis.

Foi o que aconteceu no Brasil e na ditadura do Getúlio Vargas, que em Março de 1936,mandou prender o grande escritor brasileiro Graciliano Ramos, acusado sem que a acusação fosse formalizada, de ter conspirado no levantamento comunista que houve em Novembro do ano passado. Foi preso em Maceió e enviado para o Recife, onde foi embarcado com destino ao Rio de Janeiro no navio, com outros 115 presos.

Mas mais do que a política eu lamento sempre o desaparecimento de pessoas da cultura, independentemente da sua cor ou da sua ideologia, sei que é um exagero dizer isto, mas é para mim tão importante a Arte e a cultura, que desculpo "qualquer coisinha", mesmo que isso possa reflectir um desvio em relação à minha maneira de pensar.

Quero dizer com isto que morreu em Bombaim no dia 18 de Janeiro, Rudyard Kipling, o prémio nobel da Literatura em 1907.

 Normalmente considera-se Kipling o principal representante da literatura imperialista, mas esta interpretação é superficial, se se aprofundar na sua obra , as preocupações com a relação entre os dominadores brancos e a população indígena, estão lá ainda que ele não seja exactamente um revolucionário

Para outros as suas principais obras Kim e O Livro das Terras Virgens, são convencionalmente consideradas obras infantis, mas que realmente não o são, moralistas ? por certo que sim, mas voltam sempre à realidade das relações sociais no Império Britânico, a sua grande preocupação.

Deixo a parte final do poema If (é muito extenso )

Se vivendo entre o povo és virtuoso e nobre...
Se vivendo entre os reis, conservas a humildade...
Se inimigo ou amigo, o poderoso e o pobre
São iguais para ti à luz da eternidade...

Se quem conta contigo encontra mais que a conta...
Se podes empregar os sessenta segundos
Do minuto que passa em obra de tal monta
Que o minute se espraie em séculos fecundos...

Então, á ser sublime, o mundo inteiro é teu!
Já dominaste os reis, os tempos, os espaços!...
Mas, ainda para além, um novo sol rompeu,
Abrindo o infinito ao rumo dos teus passos.

Pairando numa esfera acima deste plano,
Sem receares jamais que os erros te retomem,
Quando já nada houver em ti que seja humano,
Alegra-te, meu filho, então serás um homem!...


-( tradução de Féliz Bermudes)



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