quarta-feira, 5 de maio de 2021

Cantando espalharei por toda a parte

 

Cantando espalharei por toda a parte


Casa Comum, 31 de Agosto de 1935

Cara amiga

Com a "rapidez" que caracteriza o governo de Salazar, que se move à velocidade média de um caracol, muito por força da sua mentalidade desconfiada, a isso se deveu a demora na inauguração oficial da Emissora Nacional o que finalmente aconteceu em 1 de Agosto passado, já que pelo menos desde 1933, se andaram a fazer emissões experimentais a partir de um emissor de Onda Média de 20 Kw instalado em Barcarena.

Contudo, desde 1930, data em que foi criada a EN, na dependência dos CTT, a Direção dos Serviços Radioelétricos autorizara a aquisição de dois emissores de Onda Média e Curta.

Portanto 5 anos para arrancar a emissora é tempo demasiado, mas finalmente lá avançou

"Cantando espalharei por toda a parte". a camoniana divisa da estação, cujo primeiro diretor artístico é o Dr. António Joyce, um distinto advogado lisboeta, mas formado em Direito em Coimbra e senhor de vasta cultura, com formação musical, tendo sido há uns anos atrás reorganizador do Orfeão Académico de Coimbra.

Duvido é que ele tenha paciência, para aturar a fiscalização que vai ter da parte do poder. ele que não sendo um homem de políticas, tem no seu currículo, ter secretariado o Presidente Teixeira Gomes, nos tempos da República, que ele por certo não esqueceu.

Os estúdios são na rua do Quelhas, não muito longe afinal do "escritório" do botas, que não dorme em serviço, afinal António Joyce é só o diretor artístico, provavelmente responsável pela qualidade da programação mas os chefes são de confiança, a Direção é constituída pelo cap. Henrique Galvão, Eng. Manuel Bivar e Dr. Pires Cardoso, tudo gente da "casa".

Afinal o Dr. Salazar não se esquece de fomentar (direi controlar) a diversão, pois também criou há dias concretamente em 13 de Junho passado, a Fundação Nacional para a Alegria no Trabalho, conhecida como FNAT, que se propõe igualmente organizar os tempos livres dos trabalhadores.

Não sei o que isso irá dar, mas naturalmente que a preocupação de tudo estar sob controlo também o leva não deixar ao acaso as hora livres dos trabalhadores, eventualmente as mais perigosas, pensará ele.

Ficará então tudo sobre controlo, os dias de trabalho e os de folga também, é esta a essência do estado corporativo.

Só aparentemente escapará a vertente religiosa, mas a confiança depositada no amigo Cerejeira o cardeal de Portugal, que não deixará margem para outras fantasias, que ultrapassem o espírito beato, da máxima salazarista do "pobrezinho mas feliz, que vai à missa ao domingo".

Então e as suas férias ? julgo que em Setembro como habitualmente irá para a Praia das Maçãs. Embora francamente não saiba onde vc irá ficar, pelo menos desde o incêndio do Royal Hotel Bellevue, em 1921, que era poiso certo. Depois informe-me que eu apanho o elécrico em Sintra e vou visita-la

Vamos ouvir os Prelúdios de Liszt ? Parece-me uma boa escolha neste tempo de Verão.

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